Stalking nos condomínios

18 de dezembro de 2024

Stalking nos condomínios

Inicialmente é importante para caracterização deste crime é necessário que se tenha o estado de permanência e habitualidade, ou seja, a prática reiterada de perturbação/perseguição.

Trazendo um panorama histórico até chegarmos a tipificação do Stalking como crime, é que ante o grande número de situações comportamento persecutório em 1933, a Dinamarca é a pioneira na legislação sobre o Stalking, somente a partir de 1990, o fenômeno passou a receber atenção nos Estados Unidos, devido ao trágico incidente que resultou na morte da atriz americana Rebeca Schaeffer, perpetrada por um fã perseguidor

No Brasil, antes, a prática era enquadrada apenas como contravenção penal, que previa o crime de perturbação da tranquilidade alheia, punível com prisão de 15 dias a 2 meses e multa. Sendo que em 2021 foi incluído pela Lei 14.132 no Código Penal o artigo 147-A, trazendo para o texto legal o crime de perseguição, crime de stalking.

Esta lei foi promulgada em pleno momento pandêmico, onde houve o aumento de casos de perseguição, tanto online como presencial, nos condomínios tivemos um maior número de grupos de WhatsApp, e mais pessoas por maior período no ambiente condominial, sendo que a comunicação em alguns casos de forma agressiva, ultrapassando os limites e a educação para com todos, moradores e síndicos.

Após investigação, caso seja caracterizado o crime de stalking, a pena é de reclusão de 6 meses a 2 anos, e multa. podendo ser majorado se for criança, adolescente, idoso ou mulher perseguida por razões da condição do sexo feminino. Importante aqui mencionar, que quando se fala em início da pena, em reclusão, é uma pena que admite que o regime inicial seja o fechado, dependendo da gravidade. Além disso, a vítima do stalking pode entrar com uma ação civil por danos morais contra o agressor, buscando uma compensação financeira pelos danos emocionais sofridos.

Tal lei pode ser aplicada nos condomínios, desde que cumprido os requisitos (permanência e habitualidade), no âmbito condominial ela pode ser aplicada não só na relação moradores para com o síndico, mas do síndico com moradores e moradores com moradores.

Esta Lei veio para trazer mais segurança e tranquilidade nas situações que ocorrem no dia a dia dos condomínios, no entanto é importante que se tenha cuidado, a parte que se sente perseguida deve ter provas do crime, como mensagens, imagens, e-mails, áudios, para que sejam juntadas no momento da abertura do boletim de ocorrência para análise e verificação da caracterização do crime ou não. Para a condução da abertura do boletim de ocorrência importante consultar um advogado especialista, para que seja verificado qual crime se enquadra na situação. Pois em determinadas situações não se trata de stalking, mas sim calúnia, difamação, injúria e até ameaça.

Principalmente se for o caso do síndico ser a pessoa que alega a perseguição, pois, nessa situação tem sido o entendimento dos tribunais que: assuntos que envolvam a gestão do condomínio diretamente, não se caracterizam stalking ou

perseguição, mas sim exercício do direito do condômino em questionar, como por exemplo o morador questionar todos os meses situações relacionadas as contas. Caracterizando mero dissabor inerente ao cargo. Pode sim a situação se enquadrar em algum outro crime, mas não stalking, é sempre necessária a análise do caso concreto. Nos condomínios existem muitas situações relacionadas diretamente ao síndico, por isso deve ser verificado antes, se ela se direciona à gestão ou a pessoa física do síndico.

Cabe aqui trazer alguns exemplos para ficar mais fácil a visualização:

- Moradores com o síndico, quando o morador de forma desrespeitosa se refere a má gestão da síndica, mas não falando da gestão em si, mas dizendo que pelo fato de ser mulher é fraca, falando para outros moradores sobre questões da vida pessoal da síndica de forma caluniosa, mandando mensagens intimidatórias, perseguindo na rua, esperando a pessoa do síndico em lugares para assustar e intimidar. Pode caracterizar o Stalking pois não são questões relacionadas a gestão. Tive um caso em que uma moradora colocou no elevador cartazes, que diziam que a síndica era xenofóbica, fazia cartas falando sobre a conduta pessoal e íntima da síndica e colocava nas caixas de correio, tudo gravado pelo circuito interno de câmeras do condomínio, a síndica procedeu com a abertura do boletim de ocorrência, e a conclusão da investigação enquadrou nos seguintes crimes: Stalking, calúnia, ameaça.

É comum ocorrer essa perseguição ao síndico por pessoas que fazem parte do conselho ou ainda pessoas que não participam de assembleias, que para incomodar o gestor começam a falar pelos corredores, mandar mensagens, de situações da vida pessoal do síndico, lembrando que ainda pode caracterizar quando é contra a gestão outros crimes, como: injúria, calúnia, difamação, ameaça.

- Condôminos com condôminos: Atendi uma situação em que: o morador de 40 anos, se aproximou de uma vizinha, adolescente de 16 anos, dizendo-lhe que tinha interesse em sair com ela e entregou-lhe um cartão de visitas. Alega a adolescente, que após esta abordagem o condômino / vizinho, começou a segui-la toda vez que ela saia de casa. Nessa situação caracteriza o crime de stalking e a pena deverá ser majorada pois se trata de adolescente.

Ainda entre moradores: uma situação em que duas moradoras começaram a reclamar de forma insistente de uma terceira, reclamando de barulho, latidos, olhando no olho mágico da porta para sair ao mesmo tempo e discutir no corredor, cheguei a notificar a moradora, mas as reclamações eram insistentes, e as moradores que reclamavam ajuizaram uma ação contra a que supostamente fazia barulho, antes de notificar a pessoa da qual reclamavam, foi orientado ao síndico a ir no condomínio nos horários em que as outras duas mais reclamavam, e quando elas escreviam reclamando ele estava lá, e pode identificar que não procediam as reclamações, sendo assim o mesmo foi orientado a explicar as moradoras reclamantes que essas reclamavam em excesso que podiam ser enquadradas no crime de stalking.

Há casos também em que o síndico é o perseguidor, ele utiliza do seu poder como síndico para perseguir algum morador, notificando-o e multando-o porque não gosta ou porque em algum momento teve algum questionamento feito por

este morador e não gostou, ou até a perseguição ocorre pela escolha sexual, política e raça, o que agrava ainda mais a pena.

No mesmo momento passa a vigorar a Lei Geral de Proteção de Dados, onde todos os condomínios devem se adaptar as regras previstas na Lei para segurança do condomínio A LGPD vem e traz uma maior segurança para os moradores do condomínio, pensando aqui que o condomínio é o detentor de informações e deve fazer devidamente a guarda destas.

Conforme determinação da LGPD, as imagens e documentos não são disponibilizados a todos os condôminos é uma segurança aos dados sensiveis e uma forma de inibir a prática de perseguições nos condomínios.

Existem condomínios que exigem dados como RG, CPF e fotos para entrada em condomínio, essas exigências são embasadas na segurança, o condomínio fica responsável pela guarda desses dados, podendo inclusive ser responsabilizado caso tenha vazamento de informações e sejam utilizadas de forma indevida.

Imagens de câmeras de circuito interno, só podem ser disponibilizadas mediante solicitação judicial ou delegado de polícia. Não é permitido que os moradores tenham acesso as imagens das câmeras, tampouco de terem câmeras nas áreas privativas que visualizem a área comum.

A LGPD nessa situação, protege o que prevê Constituição Federal em seu art. 5º que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”

Para que se tenha uma boa gestão, clara e transparente, é necessário que o síndico seja bem-informado, orientado, tanto para informar como para fiscalizar as condutas dentro do condomínio.

Se atentar para algumas situações no ambiente do condomínio, como por exemplo: Comportamentos invasivos: Presença constante e sem motivo nas proximidades da unidade da vítima, invasão de espaço pessoal, ou uso das áreas comuns para vigiar. Mensagens, ligações ou bilhetes indesejados: O envio constante de mensagens ou a tentativa de estabelecer contato, mesmo após pedidos para que isso cesse, é um sinal de comportamento obsessivo. Uso de câmeras de segurança: O monitoramento obsessivo por meio de câmeras, quando o acesso às gravações é feito de forma inadequada, também configura uma invasão de privacidade. Sinalizar comportamentos suspeitos: É importante que moradores estejam cientes do que pode caracterizar stalking e que possam relatar comportamentos suspeitos à administração. Instalação de Câmeras e Monitoramento Ético: Câmeras nas áreas comuns são úteis para segurança geral, mas o acesso deve ser controlado e só usado para fins de segurança, impedindo qualquer uso que favoreça perseguições. Regras para Respeitar a Privacidade: É essencial estabelecer normas de convivência que evitem ações invasivas, como tirar fotos ou fazer gravações de outros moradores sem consentimento. Canal de Denúncia: Fornecer um canal seguro para que as vítimas possam denunciar casos de stalking à administração do condomínio sem medo de represálias.

O síndico como responsável pelo condomínio e pela manutenção do bem-estar, segurança e saúde de todos, deve ter uma postura preventiva e orientativa, para

que não tenha esses casos que trazem um grande desgaste emocional e psicológico. Sendo que deve procurar profissionais para trazer orientações aos condôminos, comunicados, palestras, cartazes e campanhas informativas podem ajudar os moradores a compreenderem a seriedade do stalking e a importância de respeitar o espaço e a privacidade alheios.

O preocupante é que a situação do Stalking pode e na maioria das vezes desencadear para violência, podendo esta ser física ou verbal, por isso a importância do trabalho preventivo, pois as consequências podem ser fatais.

Criar uma cultura de respeito e segurança nos condomínios é fundamental para prevenir o stalking e outros comportamentos abusivos, promovendo uma convivência saudável e harmoniosa entre os moradores.

Cada pessoa traz consigo valores e culturas diferentes. Incentivar a tolerância e o respeito entre os moradores contribui para um ambiente acolhedor e sem discriminação.

Sempre e tanto na situação do stalking como de qualquer tipo de violência e maus tratos é necessário auxílio à vítima e denúncia imediata. A conscientização e o apoio à vítima são essenciais para enfrentar esse comportamento. É responsabilidade de todos – sociedade, autoridades e indivíduos – reconhecer o stalking, apoiar as vítimas e agir para prevenir esse tipo de violência.

Viver em condomínio é compartilhar um espaço que vai muito além de paredes e portões. É dividir um ambiente que, quando administrado com respeito, colaboração e transparência, se torna um verdadeiro lar para todos os seus moradores. A convivência harmoniosa depende do compromisso de cada pessoa em respeitar as normas e os vizinhos, buscando sempre o diálogo e a empatia. Em um condomínio onde todos se esforçam para manter a harmonia, o resultado é uma comunidade que oferece qualidade de vida, segurança e, acima de tudo, um ambiente onde cada um se sente em casa. Afinal, a união e o respeito são o alicerce de uma convivência saudável e sustentável.

[09:27, 18/12/2024] AACEP:

Bianca Tedeschi Ruggi, .advogada há 10 anos inscrita na OAB/PR 71.669, atua na área condominial, Coordenadora Estadual da ANACON, Sócia da Administradora de Condomínios Grupo Ruggi, associada e fundadora da AACEP

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

desenvolvido com por AACEP © 2025
map-marker